IIª Parte
Ao fim de todo esse tempo, as enfermeiras que estavam a tratar dos meus bebés e que tinham assistido a tudo, disseram-me que estava na hora de tratar deles e que eu poderia aprender as várias tarefas para ser eu depois a fazê-las, a cada 3 horas. E assim começou o meu estágio na UCIRN, a aprender a cuidar dos meus bebés, primeiro dentro das incubadoras, mesmo para lhes dar banho, e mais tarde nos pequenos berços para onde passaram. De 3 em 3 horas, de dia e de noite, subia à UCIRN (quando já lá não estava a contemplar os meus anjinhos) para nova ronda de temperaturas, tensões, fraldas, biberões. Aliás, os biberões vieram mais tarde. No início, os meus pequeninos nem força tinham para se alimentar por biberão, pelo que eram alimentados por uma sonda gástrica. É tão difícil ver num ser tão diminuto, um tubo em plástico a entrar-lhe pelo nariz, por onde lhe injectam (sim, mesmo com uma seringa) leite de 3 em 3 horas. Foi a única coisa que nunca fui capaz de fazer: alimentá-los através da sonda (nem conseguia tocar naquela coisa), e vê-las a tirar e a meter aquele tubo nos meus bebés. Lembro-me de uma vez a enfermeira, inadvertidamente, estando eu presente, ter tirado a sonda a um deles à minha frente: toda eu estremeci, os meus olhos encheram-se de lágrimas e eu pedi-lhe para não o voltar a fazer ao pé de mim, porque não aguentaria. Nos intervalos destas rondas, também de 3 em 3 horas, de dia e de noite, ia para a sala das bombas e estimulava o peito, nos primeiros tempos apenas durante 10 minutos de cada lado, e isto para conseguir tirar umas quantidades risíveis de leite, mas aos poucos, com a persistência da minha obsessão em alimentar os meus filhos com o meu leite, durante cada vez mais tempo, até que cheguei à meia-hora em cada peito, e não tirava mais porque me disseram que não deveria estar mais tempo com a bomba por esta ser muito agressiva. E se era!... Vezes houve em que, ao colocar a bomba na mama e ligá-la, a primeira coisa a sair foi sangue e não leite. Nessas alturas, eu desligava a bomba, limpava o sangue com um lenço, e recomeçava as vezes que fossem necessárias até que saísse o leite limpinho para levar aos meus filhos. E, de dia e de noite, no fim de tirar leite, subia à UCIRN e ia guardar aquele tesouro lá em cima para o poderem dar na mamada seguinte aos meus bebés. No início, o pouco leite que fui conseguindo era exclusivamente para o meu passarinho, por ser mais pequenino e ter eventualmente menos defesas, mas à medida que fui continuando com a estimulação, o leite foi chegando para alimentar os dois, e acabou mesmo por dar ainda para congelar para o futuro, e finalmente, quando ultrapassei a minha “quota” de ocupação do congelador da UCIRN (sim, porque com tantos bebés, tem que ser assim), informaram-me que iriam ter que “descartar” (eufemismo para “deitar fora”) algum do meu leite. Foi mais um momento difícil, ver aquele tesouro que tantas dores eu tinha suportado para conseguir, ser descartado por falta de espaço. Andava completamente exausta com todos estes afazeres, mas nem me apercebia, até um dia uma enfermeira da UCIRN me ter parado por um momento e me ter dito: “A E. precisa de descansar. Já olhou bem para si?”. Tinha as pernas inchadas como nunca tinha tido (nunca tive as pernas inchadas, nem muito, nem pouco, nem no fim da gravidez, nunca me tinha acontecido) por passar demasiadas horas em pé e não descansar nada, mas não houve nada capaz de me parar, e continuei com o meu ritmo, a tratar dos meus bebés como eu achava que devia. (continua).